Circo Picolino retoma atividades públicas com espetáculo


Fotos: Maiana Oliveira/Divulgação

Beira do mar, lugar comum
Começo do caminhar
Pra beira de outro lugar”

(Gilberto Gil).

Vida, Morte e Renascimento. 38 anos de produção e formação circense. Dos ventos em brisa-mar, muitos foram os artistas que deste porto desbravaram potências artísticas e aportaram em outras picadeiros pelo mundo. O Circo e Escola Picolino, que hoje encontra-se ilha em meio à um canteiro de obras em Pituaçu, permanece sendo um celeiro para as artes circenses, muitos cresceram nele e alguns que se aproximaram nos últimos anos.

É a partir destes que o Picolino resiste, reinventa-se e que poderemos assistir nos próximos dias 16 e 17 de dezembro, 17h, a um espetáculo circense contemporâneo, que traz  uma diversidade de técnicas circenses, incluindo aéreos, acrobacias, equilibrismo e outras expressões artísticas. As apresentações são gratuitas e/ou pague quanto puder.

O espetáculo, resultado de uma residência artística contemplada pelo edital Diálogos Artísticos –Bicentenário da Independência na Bahia e tem apoio financeiro da Fundação Cultural do Estado da Bahia, unidade vinculada à Secretaria de Cultura (Funceb/SecultBa), conta com um elenco de linguagens artísticas diversas – Alice Cunha, Any Gonçalves, Ed Carlos, Felipe Cerqueira, Lara Boker, Luana Tamaoki Serrat, Marcelo Galvão, Nina Porto, Pedro Silva e Yerko Haupt.

A obra tem como mote os atuais processos do circo e as desafiantes convivências, existências e resistências diante das obras de requalificação da Orla de Pituaçu, que podem vir a deslocar o picadeiro para outro espaço. O Picolino está aterrado há mais de  20 anos no mesmo local. A fonte de inspiração é a palavra “mudança” e toda a sua complexidade social,

“O Picolino está prestes a mudar de local, uma transformação que ecoa como uma jornada de vida, morte e renascimento. É uma despedida emocionada de um circo que deixou sua marca ao longo de 38 anos, uma celebração aos ancestrais mais próximos, como Anselmo Serrat e Clóvis Gonçalves. Cada artista residente traz consigo a mudança pessoal como bagagem para a cena”, pontua a artista circense Nina Porto, também publicitária.

O espetáculo é o resultado do encontro de 10 artistas de várias gerações e formações circenses diversas, sendo notável que 90% deles foram formados ou passaram pela Picolino. A dança e a música irão desempenhar papéis fundamentais, enquanto o público testemunhará uma diversidade de técnicas circenses, incluindo aéreos, acrobacias, equilibrismo e outras expressões artísticas.

É uma  obra coletiva que tem como provocação dramatúrgica a certeza que o Circo, através do Picolino, continua a cumprir sua missão. “Com este projeto queremos defender a ideia de que sejam implementadas políticas públicas mais efetivas para apoiar os circos na Bahia”, realça o coletivo, ao recordar que, em 2007, o Picolino recebeu da Presidência da República a Ordem do Mérito Cultural em reconhecimento ao conjunto do seu trabalho.

Residência 

De acordo com Marcelo Galvão, um dos idealizadores do projeto ao lado de Luana Tamaoki Serrat, Nina Porto, Felipe Cerqueira, o principal objetivo da residência é o de oportunizar um espaço de criação e troca artística com a diversidade de artistas de circo, dança, teatro e outras artes, para aprimorarem suas habilidades técnicas e expandirem a criatividade.

Em meio às práticas e experimentações cotidianas, Luana, Nina, Felipe e Marcelo – que vêm acompanhado  todo o processo de reforma do canteiro central da orla de Pituaçu -, começaram no início de 2023 a se reunirem com o propósito de refletir sobre as necessidades emergentes de corpos pós-pandêmicos e a ocupação artística no Picolino.

“O projeto nasceu da urgência compartilhada pelos artistas em relação à lona, à cidade e à necessidade de facilitar o encontro entre artistas para a coletiva reflexão e produção circense”, destaca Galvão, ao acrescentar que o projeto é uma das possibilidades de permanência das ações educacionais e artísticas do Circo Picolino, que pode vir a ser deslocado para outra área devido a obra.

O Picolino é esse grande imaginário incomum quando se pensa Circo em Salvador, na sua maior potencialidade. Sempre encantado pelas artes circenses, Marcelo Galvão comenta que o “circo sempre esteve muito presente em minha vida, sempre fui um espectador amante das lonas. O Picolino surge adentrando meu eu-corpo a cinco anos, quando comecei a fazer aulas de Circo com Felipe, Luana e Binho e é massa hoje poder dividir a cena, eu que venho da dança e venho namorando o circo num caso de amor interessante”, declara o bailarino e coreógrafo.

Já o artista circense há 5 anos, Felipe Cerqueira enfatiza que a residência e, consequentemente o espetáculo, evidenciam a representatividade histórica da escola Picolino, “lona em que tive a honra de ser aluno há 15 anos”, assim como colegas como Ed Carlos, que cresceu e se profissionalizou aqui, viajou pelo Brasil. “Retornar pra casa, pra minha cidade e propor este projeto é uma honra”.

Cerqueira pontua que todo o projeto é uma forma de gerar mais oportunidades para os nossos e de tornar acessível as as artes circense. “Por isso, convidamos todos a fazer parte desse movimento de renovação do Picolino e de levantar a bandeira do direito de termos um espaço puramente dedicado às artes circenses para nossa cidade, espaço esse que é nosso. Que é sagrado. Alê rei!”, enfatiza Cerqueira.

Nesse contexto, a importância do projeto da Escola Picolino se torna evidente. Ao longo de seus 38 anos de fomento, a Escola Picolino desempenhou um papel vital na Bahia, oferecendo uma formação de excelência nas artes circenses. Não apenas isso, mas também exportou talentosos artistas para renomadas companhias em todo o mundo, incluindo o Cirque du Soleil.

A Bahia é um verdadeiro berço das artes. No entanto, é lamentável que, até o momento, o circo brasileiro – principalmente, o baiano – ainda não tenha encontrado espaços para formação técnica e universitária a nível federal, estadual ou municipal. E, nas últimas quase três décadas, graças ao empenho de Anselmo Serrat e Clóvis dos Santos (ambos já falecidos), e tantos outros, o Picolino preencheu uma lacuna crítica no panorama educacional e artístico em Salvador, garantindo que as artes circenses, com toda a sua riqueza e diversidade, tenham um espaço para crescer e prosperar.

Prosperar, é desenvolver-se em comunidade. Foi desta forma que Ed Carlos – conhecido como Binho – chega ao Picolino, aos oito anos. Cresceu, profissionalizou-se e é um dos artistas convidados do projeto. “Há 33 anos quando chego a Escola Picolino, estava saindo de uma situação de rua. Espaço que tem uma representatividade enorme na minha vida, que me permitiu comprar uma casa aos 18 anos, me ensinou o que é ser pai. Principalmente, Anselmo, que me abraçou e foi um pai para mim”.

Binho exclama que, após esses 33 anos, a Picolino infelizmente ainda não recebe da população o reconhecimento necessário diante da sua intervenção política, educacional e artística. “Hoje, temos poucas pessoas que conhecem a nossa história Mas, sinto-me esperançoso ao perceber a vontade deste coletivo de movimentar o espaço e de resgate”, reforça o artista, que aproveita para parabenizar Any Gonçalves, “que nos últimos anos tem se dedicado a cuidar e manter o espaço físico erguido”.

Herança

Se o Picolino é hoje a ancestralidade circense para muitos artistas. Este picadeiro nasce dentro de outro circo, o Troca de Segredos. O casal Anselmo Serrat e Verônica Tamaoki recém chegados em Salvador, com o grupo Tapete Mágico, em 1985, criam a Escola Picolino. Com eles, a filha Luana Tamaoki Serrat – que em comunhão com um grande coletivo de artistas administram o espaço, entre elas Nina Porto e Any Gonçalves, ambas filhas de artistas também circenses e que fazem parte da história de resistência que é o Picolino, uma herança e patrimônio material e imaterial do circo na Bahia.

“O Circo Picolino é como um irmão mais velho. Cresci brincando neste quintal. Foi onde aprendi a fazer circo. A artista que estou hoje veio deste lugar, onde os experimentos eram possíveis. Foi e sempre será  minha principal escola de vida. Quando meu pai faleceu em 2020, demos continuidade ao sonho dele, que também e nosso, de manter a história do Picolino. Com a pandemia, passamos por muitas situações, Cambaleamos, mas a brisa do mar trouxe uma nova galera cheia de planos e projetos. Continuar a pisar neste picadeiro como artista, ter um ombro pra subir, ter alguém pra te arremessar para cima, é um momento muito feliz”.


“A Bela Adormecida da Amazônia” em duas apresentações no TCA


Fotos: Stephane Herbert/Divulgação

A tradicional história da Bela Adormecida acaba de ganhar uma adaptação que mescla questões ambientais e contornos fantásticos para ressignificar, em plena floresta amazônica, uma das histórias mais conhecidas do mundo.

O espetáculo A Bela Adormecida da Amazônia, com dramaturgia de Ila Herbert e Samuel Herbert, dirigido pelo ator e diretor George Mascarenhas e produzido pela Gato Dourado Produções é uma realização da associação francesa La Clef Enchantée, e estreia no próximo dia 14 de dezembro na Sala do Coro do TCA, em duas sessões únicas, às 16h e 19h. Os ingressos, gratuitos, poderão ser retirados a partir do dia 11 de dezembro na plataforma Sympla e na bilheteria do Teatro Castro Alves (no dia do evento, mediante disponibilidade).

Utilizando a música do balé de Tchaikovsky e partindo de uma adaptação contemporânea da obra de Charles Perrault, A Bela Adormecida da Amazônia acontece no coração da maior floresta do mundo e passeia por questões ambientais e aventuras fantásticas para narrar uma improvável e mágica parceria entre Aurora e o astronauta Sirius. A adaptação brinca com o jogo ficcional e atualiza a dramaturgia da obra clássica, criando uma história que começa nos dias de hoje, mas que é lançada para cem anos no futuro, projetando um 2123 onde a humanidade não possui mais sua maior floresta.

A atriz Evelin Buchegger e o ator Lúcio Tranchesi coordenam um jogo cênico onde diversos artistas revezam personagens para contar e cantar essa dramaturgia. Eles estão à frente de um elenco que conta ainda com a cantora lírica Vanda Otero e um coro teatral formado pelos jovens atores e atrizes Cicero Locijá, Maribá, Ananda Mariposa, Silara Aguiar e Pablo Pereira. O time de 35 artistas em cena é formado também pelo Grupo Coral do IEM – Instituto de Educação Musical e pelo coral do Colégio Manoel Novaes, que trazem os cantos das personagens, as vozes dos seres da floresta e a tradução de pensamentos que permitem construir a narrativa de forma lúdica, mesclando elementos da música erudita aos sons da natureza.

NOMES DE DESTAQUE – A ficha técnica da montagem inclui também nomes como Luciano Salvador Bahia (que assina os arranjos musicais e parte das composições da montagem), a musicista Carmen Mettig Rocha (diretora do IEM e responsável pela preparação das vozes infantis do Instituto de Educação Musical), a professora Carla Motta (responsável pela preparação vocal do coral do Colégio Manoel Novaes), o poeta Natan Barreto (que responde pela tradução das canções escritas por Olivier Bourgeat) e o percussionista Nielton Marinho. Já a  identidade visual das imagens projetadas no palco pelo VJ Eric Santana é de autoria do artista baiano Oliver Dórea, enquanto o figurino e ambientação são do artista Zuarte Jr.

A montagem feita para públicos de todas as idades se debruça, portanto, em torno de duas obras clássicas, literária e musical, para criar um grande recital encenado em sintonia com um dos objetivos da associação francesa La Clef Enchantée, criada e dirigida pela educadora e cantora lírica baiana Ila Herbert, em Paris, como projeto pedagógico, musical e cultural. A associação trabalha com a iniciação musical e a sensibilização para o mundo da ópera, utilizando um método lúdico que mergulha na teoria musical, na história da música, no aprendizado do piano e do canto junto a crianças de todas as idades. Além deste trabalho de educação e da produção de espetáculos públicos, La Clef Enchantée também publica livros educativos, como “Meu dia na ópera&quot ; ; ; ;, “Meu amigo Quebra-Nozes”, “A Flauta Mágica para crianças”, “Cinderela no Brasil” e “Foot Musical”, entre outros. “A Bela Adormecida da Amazônia” também será transformado em livro, em traduções para o francês e português.

SERVIÇO:

A Bela Adormecida da Amazônia
Data/horário: Dia 14 de dezembro, às 16h e 19h
Local: Sala do Coro do TCA
Duração: 60 minutos
Ingressos: Gratuitos, retirados a partir do dia 11/12 na plataforma Sympla ou na bilheteria do Teatro Castro Alves (no dia do evento, mediante disponibilidade)
Classificação Indicativa: Livre


Espetáculo O Rato no Muro da Hilda Hilst estreia no Teatro Martim Gonçalves


Fotos/Divulgação

Texto escrito na ditadura militar e que trata de rompimentos de paradigmas será encenado por turma de formatura da Escola de Teatro da UFBA

Qual é o seu medo? Qual é a sua culpa? É debatendo os medos, culpas e muros físicos, simbólicos e subjetivos, que o espetáculo O Rato no Muro, da dramaturga Hilda Hilst, chega ao Teatro Martim Gonçalves, dia 07 de dezembro de 2023, às 19h. Estrelado pela turma de formatura em Interpretação Teatral 2023.2, da Escola de Teatro da UFBA, a temporada segue até o dia 17 de dezembro, é gratuita, e promete tocar a alma e consciência do público, ao falar sobre a liberdade de ser e estar na vida, assim como de padrões que limitam as expressões e o desejo de pulsar diariamente.

Escrito por uma mulher e com todas as personagens femininas, a direção é assinada por  Meran Vargens, Elaine Cardim e Vica Hamed. E foi a partir das inquietações e das demandas dos estudantes que surgiu a escolha, especialmente do desejo de falar sobre tragédias cotidianas e de dar protagonismo a uma mulher dramaturga. Para a diretora Elaine Cardim, para as mulheres, por exemplo, há séculos são estabelecidos medos para galgar a sociedade capitalista e o patriarcado, e é importante ver o medo como uma estratégia.

Mais do que do pensamento artístico, a montagem que está para além  do campo intelectual e passa pelo subjetivo, tem como prioridade a formação do elenco, tendo como norte a perspectiva pedagógica, de desenvolvimento intelectual, emocional, psíquico e de alma de cada um dos e das estudantes. “É um privilégio como artista, mulher e aprendiz fazer parte do elenco de um espetáculo que descortina violências e silenciamentos que perpassam a identidade das mulheres”, conta Ana Paula Borges, atriz de O Rato no Muro.

Em um texto carregado por metáforas e que leva a um mergulho profundo na condição humana, a equipe  traz uma linguagem poética ampla e escolheu construir o trabalho com o texto pela intuição e instinto. Inicialmente, conectando a arte ao corpo e a alma, para ganhar intimidade com os pensamentos e as palavras da autora. Escrito em 1967, em  período de opressão, censura e desvalorização da arte, para Rafael Britto o momento em que a Hilda Hilst escreve o texto é de um marco histórico muito importante, um processo ditatorial que não permite o meio termo, a diversidade, a diferença.

“Ela [Hilda Hilst] nos motiva a pensar nas repressões cotidianas , nos silenciamentos que nos impedem de falar sobre ser uma pessoa soropositiva, homem gay, afroindígena, como eu sou. Construir o espetáculo me permitiu rememorar alguns medos e perceber o quanto eles me limitaram e me impediram de ser quem desejava. Foi doloroso, mas também me proporcionou perceber um outro cara, quem sou hoje, o quanto que sou vencedor por ter me livrado dessa culpabilização e medos”, ressalta Rafael.

Quem incute o medo que existe em nós? Quem edifica o medo e a culpa?, questiona a diretora geral Meran Vargens, que acredita que é preciso dar atenção ao que mobiliza o medo e a culpa. “Existe alguém, em um plano de poder e interesses evidentes, que tem objetivo de trucidar aquilo que emana da vida, do que é viver e expressar, que se propõe a atiçar aquilo que não é vida e que se opõe ao brilho da existência”, completa Meran.

Os espectadores podem aguardar palavras como verdadeiros portais, interações se revelando a partir do campo magnético, do vínculo sincero e efetivo, e ver a arte agir no imaginário e potencializar lembranças, dores, angústias e, em contrapartida permitir o alcance de cosmovisões múltiplas. Tudo isso agregado a iluminação de Otávio Correia, que traz sombras, se soma a cenografia digital de Marcus Lobo, e revela em sincronia com projeções em uma caixa preta –  que faz alusão aos muros que encontramos não só no convento que existe na história de Hilda, mas em outros ambientes sociais e existentes atualmente -, a criação das atmosferas e espaços do espetáculo.

Com figurino e maquiagem de Thiago Romero, que pretende evidenciar as diferenças ao mesmo tempo que traz a unicidade e demonstra que todas as personagens são uma só, será possível ver uniformes que expõem o hábito, o padrão e retiram as identidades das personagens, as irmãs que não têm sequer nome. O público ainda será surpreendido com um forte trabalho de vocalização, em uma aura sonora fortalecida por Luciano Bahia, que assina a direção musical e a trilha sonora junto a Elaine Cardim, uma das três diretoras que trabalham com voz e constroem com a equipe o forte recorte musical presente no trabalho.

SERVIÇO

O QUÊ? Espetáculo “O Rato no Muro”, da dramaturga Hilda Hilst

ONDE? Teatro Martim Gonçalves (Av. Araújo Pinho, 292 – Canela, Salvador – BA)

QUANDO? 07 a 17 de dezembro de 2023 (quinta a domingo)

QUANTO? Gratuito

FICHA TÉCNICA

Texto: Hilda Hilst

Direção Geral: Meran Vargens

Direção: Elaine Cardim e Vica Hamed

Professoras orientadoras: Elaine Cardim e Vica Hamed

Elenco: Ana Paula Borges, Ceia Correia, Lana Sacramento, Lívia Maria, Marina

Torres, Nina Andrade, Rafael Britto, Renata Benigno, Victor Hugo Carvalho

Iluminação: Otávio Correia

Cenografia: Marcus Lobo

Figurino e maquiagem: Thiago Romero

Direção musical: Luciano Salvador Bahia


Festa de Santa Bárbara com 382 anos é um dos Bens Imateriais protegidos pelo IPAC


Fotos: Fernando Barbosa/Divulgação

Iniciada no século XVII, desde 1641, quando o casal de portugueses, Francisco Pereira do Lago e Andressa de Araújo, fizeram uma promessa no Morgado de Santa Bárbara, no bairro do Comércio, ao pé da atual Ladeira da Montanha, a Festa de Santa Bárbara acontece mais uma vez em Salvador, nesta segunda-feira (4), a partir das 6h, como uma síntese da cultura baiana que carrega influências europeias e africanas, simultaneamente. Neste ano (2023), a Festa completa 382 anos de existência e é um dos Bens Imateriais registrados como ‘Patrimônio da Bahia’ através do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC).

O IPAC é integrante da Secretaria de Cultura do Estado (SecultBa) que repassou neste ano (2023) o investimento de aproximadamente R$ 386 mil para a realização das comemorações e outras ações correlatas. A programação de segunda (4) inclui ‘alvorada’ de foguetes, missa campal, procissão com sete andores decorados com santos católicos, além de apresentações e shows musicais nos largos Tereza Batista, Quincas Berro D’Água e Pedro Archanjo, no Pelourinho.

A manifestação passou a ser Patrimônio da Bahia em 2008 via Decreto nº 11.353 do Governo da Bahia. O roteiro começa no Largo do Pelourinho e depois uma procissão segue para o Terreiro de Jesus, Praça da Sé, Praça Municipal, Ladeira da Praça, parando na sede do Corpo de Bombeiros, na Praça dos Veteranos, seguindo na Baixa dos Sapateiros até o Mercado de Santa Bárbara e voltando ao Largo do Pelourinho onde os andores com os santos ficam por um tempo à espera de fiéis e devotos. (programação mais ABAIXO).

ORDEM, PATRIMÔNIO e LIVRO – Depois de um incêndio que destruiu o Morgado, no Comércio, a imagem da santa, que tinha capela própria, foi para a Igreja do Corpo Santo e, finalmente, para o Rosário dos Pretos. “Desde 1997, a festa é organizada pela Venerável Ordem Terceira do Rosário de Nossa Senhora às Portas do Carmo Irmandade Dos Homens Pretos”, explica a diretora do IPAC, Luciana Mandelli. Todos os anos, o evento reúne mais de 10 mil fiéis no Centro Histórico de Salvador. São visitantes de todo o Brasil e até do exterior vindo participar das festividades que têm início com o Tríduo na Igreja entre os dias 01° e 03 de dezembro.

O Rosário foi fundado em 1685 e passou à Ordem 3ª em 1899. “Devido à importância cultural, artística e histórica da Igreja do Rosário dos Pretos, o conjunto é tombado como ‘Patrimônio do Brasil’ pelo IPHAN, desde 1938”, completa Luciana Mandelli. Acesse o site www.ipac.ba.gov.br, o instagram @ipac.ba, o facebook Ipacba Patrimônio e twitter @ipac_ba.

Os interessados podem acessar gratuitamente o livro do IPAC ‘Festa de Santa Bárbara’ no site www.ipac.ba.gov.br, no lado esquerdo da primeira página, no link ‘Publicações para download’ e, depois, no link ‘Cadernos do IPAC’. Ou no link https://drive.google.com/file/d/0B3D0pMS8V_3sQ1lGamhFOUc2cDQ/view?resourcekey=0-gzANAnvJRFyHCPG-GoDcNw.

Box opcional: HISTÓRIA – A Festa de Santa Bárbara remonta ao ano de 1639, quando o casal Francisco Pereira e Andressa Araújo construiu capela devocional no comércio às margens da Baía de Todos os Santos, em Salvador. Desde então a festividade, transferida para o Pelourinho, tornou-se não somente fonte de fé para católicos como também para adeptos da religiosidade de matrizes africanas, que chegam de diversos estados brasileiros e até de fora do Brasil para participar da festa e procissão em Salvador.

A programação inclui tríduo de celebrações eucarísticas e termina na Igreja do Rosário dos Pretos. A igreja e seus bens móveis, como as imagens dos santos, pinturas do teto e azulejos foram restaurados pelo IPAC ao custo de R$ 2,6 milhões no início da década de 2010. Autarquia da Secretaria de Cultura do Estado (SecultBa), o IPAC recebeu nessa época recursos do Tesouro Estadual e do programa federal Prodetur, financiamento do Banco Interamericano, via Ministério do Turismo e Secretaria do Turismo, e investimento do Banco do Nordeste.

A exposição permanente que existe no corredor lateral da Igreja do Rosário dos Pretos também aconteceu graças ao Edital de Museus do IPAC. A mostra é uma homenagem à Irmandade e à Venerável Ordem Terceira do Rosário às Portas do Carmo, nome da entidade, fundada por descendentes de escravos e ex-escravos que construíram a igreja.


Retrospectiva do fotógrafo Walter Firmo abre dia 5 no MAM Bahia


Fotos/Divulgação

A esperada exposição ‘Walter Firmo: no verbo do silêncio a síntese do grito’ finalmente chega a Salvador em 5 de dezembro, com abertura às 17h, no Museu de Arte Moderna (MAM Bahia). Às 18:30h do mesmo dia será realizada uma Mesa de conversa com o fotógrafo Walter Firmo e os curadores da mostra, Janaína Damaceno e Sergio Burgi no Cine MAM, com acesso gratuito, mas sujeito à lotação da sala. Após a Mesa no Cine MAM, está marcada uma visita do artista à exposição. A previsão é que mostra fique aberta até final de março/24.

Com 86 anos de idade, dezenas de exposições/livros e 68 anos de carreira, o carioca Walter Firmo, nascido em 1937, é considerado um dos fotógrafos mais importantes do país, com fotos ícones da memória e da cultura brasileiras. Dentre os seus prêmios, estão o Prêmio Esso de Reportagem (1964), sete prêmios no Concurso Internacional de Fotografia da Nikon (entre 1973 a 1982), o Prêmio Golfinho de Ouro (1985), o Bolsa de Artes do Banco Icatu (1998) e a Ordem do Mérito Cultural (2004).

A mostra é uma iniciativa do Instituto Moreira Salles (IMS) com apoio do Governo do Estado da Bahia, através da Secretaria de Cultura (SecultBA), Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC) e MAM Bahia. A visitação é gratuita de terça-feira a domingo, das 10h às 18h. A retrospectiva tem 200 obras do artista, consagrado por sua sequência de projetos que registram e celebram o povo e a cultura negra do Brasil. A seleção traz desde imagens do início de sua carreira até registros recentes. No conjunto, há fotos de manifestações culturais e religiosas, retratos icônicos de artistas como Pixinguinha, Dona Ivone Lara e Clementina de Jesus, entre outros destaques.

“Para nós é uma grande honra receber um artista da magnitude e da importância de Walter Firmo integrando a programação do Novembro Negro no MAM Bahia, contando com essa parceria especial com IMS e sendo mais uma atração de um novo momento de readequação e requalificação dos Museus do Instituto”, ressalta a diretora geral do IPAC, Luciana Mandelli. Além do MAM, o IPAC administra os mais importantes museus baianos, como o de Arte Contemporânea (MAC), o de Arte da Bahia (MAB), o Museu do Recôncavo e o Solar Ferrão, dentre outras importantes coleções de arte.

CURADORIA e SOLAR do UNHÃO – A curadoria da exposição é de Sergio Burgi, coordenador de Fotografia do IMS, e da curadora adjunta Janaína Damaceno Gomes, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e coordenadora do Grupo de Pesquisas Afrovisualidades: Estéticas e Políticas da Imagem Negra. A retrospectiva também conta com assistência de curadoria da conservadora-restauradora Alessandra Coutinho Campos e pesquisa biográfica e documental de  Andrea Wanderley, integrantes da Coordenadoria de Fotografia do IMS.

Segundo a diretora do MAM Bahia, Marília Gil, a seleção de fotos ocupa o primeiro pavimento do Casarão do museu. “Trata-se do primeiro piso do Solar do Unhão, que é climatizado e cuja edificação é tombada como Patrimônio do Brasil desde 1943, juntamente com a Capela e outros remanescentes”, completa Marília. As fotos da mostra foram produzidas da década de 1950, início da carreira de Firmo, até 2021.

Aparecem ainda imagens de diversas regiões do Brasil, com registros de ritos, festas populares e cenas cotidianas. O conjunto destaca a poética do artista, associada à experimentação e à criação de imagens muitas vezes encenadas e dirigidas. Grande parte das obras exibidas provém do acervo do fotógrafo, que se encontra sob a guarda do IMS desde 2018 em regime de comodato.

Nas fotografias, prevalece uma aura de afetividade e valorização da negritude, como afirma o próprio Walter: “Acabei colocando os negros numa atitude de referência no meu trabalho, fotografando os músicos, os operários, as festas folclóricas, enfim, toda a gente. A vertigem é em cima deles. De colocá-los como honrados, totens, como homens que trabalham, que existem. Eles ajudaram a construir esse país para chegar aonde ele chegou”, explica Firmo.

SOCIEDADE RACISTA – A curadora adjunta Janaína Damaceno Gomes também reflete sobre o tema: “Se numa sociedade racista, a norma é o ódio e o auto-ódio, como nos mostram os trabalhos de bell hooks, Frantz Fanon e Virgínia Bicudo, amar a negritude compreende um percurso necessário de cura. Não é à toa que Firmo define a cor em seu trabalho em termos de amor pelo povo e pela cultura negra, mas é necessário entender que o direito a olhar não se restringe à ideia de autorrepresentação”, finaliza Janaína.

A retrospectiva evidencia como, no decorrer de sua carreira, Firmo passou a se distanciar do fotojornalismo documental e direto, tendo como base a ideia da fotografia como encantamento, encenação e teatralidade, em diálogo com a pintura e o cinema. Sobre seu processo criativo, o artista comenta: “A fotografia, para mim, reside naqueles instantes mágicos em que eu posso interpretar livremente o imponderável, o mágico, o encantamento. Nos quais o deslumbre possa se fazer através de luzes, backgrounds, infindáveis sutilezas, administrando o teatro e o cinema nesse jogo de sedução, verdadeira tradução simultânea construída num piscar de olhos em que o intelecto e o coração se juntam, materializando atmosferas”, conclui o artista.

CATÁLOGO – Por ocasião da mostra, o IMS lançou em São Paulo o catálogo ‘Walter Firmo – No verbo do silêncio a síntese do grito’ que já está concorrendo ao renomado Prêmio Jabuti. A publicação traz as obras do autor presentes na exposição, além de textos de autoria do próprio Firmo, de João Fernandes, diretor artístico do IMS, e dos curadores Sergio Burgi e Janaina Damaceno Gomes. O livro também traz uma entrevista do fotógrafo em conversa com os curadores e com o jornalista Nabor Jr., editor da revista O Melenick, além de uma cronologia do fotógrafo assinada por Andrea Wanderley.

Mais informações sobre Walter Firmo no link https://ims.com.br/titular-colecao/walter-firmo/. Sobre o MAM Bahia no site www.mam.ba.gov.br, instagram @bahiamam e telefones (71) 31176132 e 31176139 (segunda a sexta, 9h às 12h e 13h às 15h). Sobre o IPAC, no site www.ipac.ba.gov.br e instagram @ipac.ba.

BIOGRAFIA – Nascido em 1937, no bairro do Irajá, no Rio de Janeiro, Walter Firmo conta que desde garoto sonhava em fotografar. Ingressou no fotojornalismo em 1955, como aprendiz, no jornal Última Hora, e não parou mais. Em 1955, então com 18 anos, passou a integrar a equipe do jornal Última Hora, após estudar na Associação Brasileira de Arte Fotográfica (Abaf), no Rio. Mais tarde, trabalharia no Jornal do Brasil e, em seguida, na revista Realidade, como um dos primeiros fotógrafos da revista.

Walter Firmo trabalhou em diversos jornais e revistas e construiu uma carreira longeva, reconhecida por prêmios. Um deles foi o Esso de Reportagem, em 1963, conquistado por ‘Cem dias na Amazônia de ninguém’, matéria publicada no Jornal do Brasil com fotos e texto seus. Chamado de ‘mestre da cor’, Firmo é autor de retratos memoráveis de ícones da música brasileira como Pixinguinha, Dona Ivone Lara, Cartola.

Outra vertente bastante conhecida de seu trabalho são as imagens de festas populares registradas por todo o Brasil, do carnaval do Rio de Janeiro ao bumba meu boi no Maranhão. Desde 2018 o Instituto Moreira Salles abriga, em regime de comodato, aproximadamente 145 mil fotos feitas por Firmo ao longo de várias décadas. O material estabelece um diálogo direto com outros grandes nomes do acervo do IMS, como José Medeiros, com quem Firmo trabalhou, e Marcel Gautherot.

Criado no subúrbio carioca, filho único de paraenses – seu pai, de família negra e ribeirinha do baixo Amazonas; sua mãe, de família branca portuguesa, nascida em Belém –, Firmo começou a fotografar cedo, após ganhar uma câmera de seu pai. Em 1967, já trabalhando na revista Manchete, foi correspondente, durante cerca de seis meses, da Editora Bloch em Nova York. Neste período no exterior, o artista teve contato com o movimento Black is Beautiful e as discussões em torno dos direitos civis, que marcariam todo seu trabalho posterior. De volta ao Brasil, trabalhou em outros veículos da imprensa e começou a fotografar para a indústria fonográfica. Iniciou ainda sua pesquisa sobre as festas populares, sagradas e profanas, em todo o território brasileiro, em direção a uma produção cada vez mais autoral.

Essa aproximação com a teatralização e a pintura fica evidente no ensaio realizado em 1985 com os pais (José Baptista e Maria de Lourdes) e os filhos (Eduardo e Aloísio Firmo) do fotógrafo, exibidos na exposição. Nas imagens, José aparece vestindo seu traje de fuzileiro naval, função que desempenhou ao longo da vida, ao lado de Maria de Lourdes, que usa um vestido longo, florido e elegante.

O ensaio faz alusão às pinturas Os noivos (1937) e Família do fuzileiro naval (1935), do artista Alberto da Veiga Guignard (1896-1962). A partir da década de 1970, Firmo fica muito conhecido por suas fotos que ilustram inúmeras capas de discos, com nomes como Dona Ivone Lara, Cartola, Clementina de Jesus, Paulinho da Viola, Gilberto Gil, Martinho da Vila, Maria Bethânia, Caetano Veloso, Milton Nascimento, Djavan e Chico Buarque.

O curador Sergio Burgi comenta a poética construída pelo artista: “Walter Firmo incorporou desde cedo em sua prática fotográfica a noção da síntese narrativa de imagem única, elaborada através de imagens construídas, dirigidas e, muitas vezes, até encenadas. Linguagem própria que, tendo como substrato sua consciência de origem – social, cultural e racial –, desenvolve-se amalgamada à percepção da necessidade de se confrontar e se questionar os cânones e limites da fotografia documental e do fotojornalismo. Num sentido mais amplo, questionar a própria fotografia como verossimilhança ou mera mimese do real”.

Serviço

O quê: Exposição ‘Walter Firmo: no verbo do silêncio a síntese do grito’

Quando: 05.12.2023, às 17h, c/visitação gratuita de terça-feira a domingo, das 10h às 18h

Onde: MAM Bahia (Av. Contorno, s/n – Comércio, Salvador – BA, 40301-155 – Telefones 71 31176132 e 31176139)

FOTOS: LINK com fotos da Exposição Walter Firmo no MAM repassadas e autorizadas pelo pessoal do Instituto Moreira Sales. Nesse LINK está inclusa ainda a Lista com LEGENDAS/descrição, nome e ano de cada foto:

https://drive.google.com/drive/folders/1nmadvvccUf3zGX2OiAM_QMOmYkKDLa8C